Justiça eleitoral é competente para julgar crimes comuns conexos a eleitorais, decide STF
Nesta quinta-feira, 14, os ministros do STF decidiram que a Justiça Eleitoral é competente para processar e julgar crimes comuns - como corrupção e lavagem de dinheiro -, que tenham relação com delitos eleitorais, como o caixa 2. A decisão foi tomada em placar apertado, por 6x5, contra a manifestação da PGR sobre o tema.
A decisão foi tomada na análise do recurso interposto pelo deputado Federal Pedro Paulo Carvalho Teixeira e pelo ex-prefeito do Rio de Janeiro Eduardo Paes por crimes cometidos nos anos de 2010, 2012 e 2014.
A sessão passou a ficar acalorada com o voto do ministro Gilmar Mendes, que criticou duramente os procuradores de Curitiba. “São uns cretinos”, disse o ministro ao comentar artigo de quatro procuradores, publicado na Folha de Londrina, em tom ofensivo ao presidente do STJ.
O caso
O inquérito que investiga o ex-prefeito do RJ, Eduardo Paes, e o deputado Federal Pedro Paulo pela suposta prática de crimes de corrupção passiva, corrupção ativa, lavagem de capitais, evasão de divisas e falsidade ideológica eleitoral. Os envolvidos pediam que as investigações contra eles por fatos ocorridos em 2010, 2012 e 2014 fossem mantidas sob a competência do Supremo.
A conduta supostamente cometida no ano de 2010 diz respeito ao recebimento de R$ 3 milhões do Grupo Odebrecht a pretexto da campanha eleitoral de Pedro Paulo para deputado Federal. Em 2012, a investigação se refere ao suposto recebimento por Eduardo Paes de R$ 15 milhões em doação ilegal do Grupo Odebrecht no âmbito de contratos referentes às Olimpíadas de 2016, visando à sua reeleição à prefeitura do Rio. Por fim, o fato relativo a 2014 consistiria no recebimento de doação ilegal do Grupo Odebrecht de aproximadamente R$ 300 mil para a reeleição de Pedro Paulo.
Sessão anterior
Na sessão anterior, o ministro Marco Aurélio, relator, votou pela declinação para a Justiça Eleitoral do Rio de Janeiro as investigações sobre as condutas supostamente cometidas em 2010 e 2012; os delitos de 2014 ficam no Supremo em razão da prerrogativa de foro. Ministro Alexandre de Moraes seguiu o relator.
Ainda ontem, o ministro Edson Fachin abriu a divergência quanto ao ano de 2012, determinando a cisão da investigação à JE/RJ, referente aos delitos eleitorais, e, quanto aos demais, por conexão com o delito de evasão de divisas, à JF/RJ. Quanto aos anos de 2010 e 2014, as apurações devem ser remetidas à Justiça Eleitoral, pois não têm qualquer vinculação com as atribuições do cargo.
Continuidade
O presidente do STF, ao abrir a sessão, fez um pronunciamento determinando a abertura de inquérito criminal para apuração de fatos e infrações relacionadas a fake news, denunciações caluniosas, ameaças e infrações contra o STF.
Na continuidade do julgamento na tarde desta quinta-feira, além do ministro Alexandre de Moraes, os ministros Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli seguiram o entendimento do relator Marco Aurélio, entendendo pela competência da Justiça Eleitoral para processar e julgar crimes comuns conexos aos eleitorais. Já os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia seguiram a divergência.
Luís Roberto Barroso afirmou que o Brasil vive um momento de corrupção institucionalizada, defendendo a cisão. Afirmou também que “dizer que a Justiça Eleitoral não é vocacionada para julgamento criminais não significa desmerecê-la”. Fez uma análise da estrutura da Justiça Federal do Paraná e da Justiça Eleitoral daquela região e constatou que a JE não tem nenhuma expertise em questões penais. “Nós vamos transferir para essa estrutura inexistente a competência para enfrentar a criminalidade institucionalizada no Brasil quando esteja associada a delitos eleitorais”, afirmou.
Próxima a votar, Rosa Weber analisou os crimes cometidos nos anos separadamente e concluiu que os cometidos em 2010 e 2014 devem ser remetidos à JE/RJ, por não terem relação com as atribuições do cargo. Por fim, entendeu pela cisão das investigações para que a apuração relacionada a crimes eleitorais seja enviada à Justiça Eleitoral e, quanto aos demais delitos, à Justiça Federal.
Luiz Fux também defendeu a cisão afirmando que as competências das Justiças Federal e Eleitoral são absolutas e que não há a possibilidade de perderem a sua competência absoluta constitucional. Ressaltou que a Justiça Eleitoral recebe crimes como desacato, boca de urna, agressão, condução de eleitor, etc e não tem qualificação para julgar crimes como Federais de corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro. Também defendeu que sem a qualificação definitiva não se pode aferir a competência do órgão jurisdicional, lembrando que o caso está em fase inquisitorial, sendo o MP responsável pela designação de onde o processo deve seguir.
Cármen Lúcia iniciou seu voto defendendo a excelência da Justiça Eleitoral. Também analisou os anos separadamente e seguiu a divergência. Ricardo Lewandowski seguiu o relator, afirmando que a orientação jurisprudencial, de longa data, assenta pela remessa para a Justiça Eleitoral. Ressaltou dispositivo de Código Eleitoral e reafirmou que prevalece a Justiça Especializada. Também disse que caixa 2 sempre foi tratado como crime eleitoral.
Gilmar Mendes iniciou seu voto defendendo a competência da Justiça Eleitoral. O ministro fez um apanhado histórico pelas Constituições e disse que em todas elas já se versava sobre a prevalência da Justiça Eleitoral no processo e julgamento de crimes conexos. Na CF de 88, ele ressaltou lei complementar específica para o tema. Em determinado momento, Gilmar Mendes teceu críticas pesadas aos procuradores da Lava Jato: “são uns cretinos, não sabem o que é processo civilizatório”, afirmou o ministro.
Ao votar, o ministro Celso de Mello também acompanhou o relator no sentido de prevalecer a competência da Justiça Eleitoral sobre a Justiça Comum, seja ela no âmbito estadual ou Federal. Ele afirmou que o dispositivo do Código Eleitoral que dispõe sobre a competência dos juízes eleitorais não representa hipótese ilegítima de atribuições jurisdicionais, não afetando o âmbito de atuação da JF Comum ou JE. O ministro também retomou o contexto histórico das CFs no sentido da atribuição da competência da JE sobre a matéria.
Último a votar, o ministro Dias Toffoli endossou que todos da Corte estão em defesa da Justiça Eleitoral, “que está pronta para atuar”. Afirmou que seu voto é no sentido de manter a jurisprudência do STF e, dessa forma, seguiu o relator.
O resultado assim foi lido pelo presidente:
Por maioria, o STF manteve sua jurisprudência quando ao dar na forma do voto do relator no que foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli parcial provimento ao agravo interposto pelos investigados para, no tocante ao fato ocorrido em 2014 reconsiderar a decisão recorrida e assentar a competência do STF. Quanto aos delitos supostamente cometidos em 2010 e 2012 declinar da competência para a Justiça Eleitoral do Estado do Rio de Janeiro e prejudicado agravo regimental interposto pela PGR na competência relativa ao delito de evasão de divisas da Justiça Federal. Vencidos os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia, que davam parcial provimento para cindir os fatos apurados.
(Fonte: Migalhas)
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1 Comentário
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Como todos sabem, o STF coonestou, por meio de seu então presidente Ricardo Lewandowski, uma decisão teratológica do Senado Federal, a qual concedeu à ex-presidente da República Dilma Rousseff, condenada no processo de impeachment, o direito de manter a habilitação para o exercício função pública, a despeito do disposto no parágrafo único do artigo 52 da Constituição, cujo teor se revela absolutamente contrário a tal concessão por oito anos. Agora, quando o fatiamento de uma competência se impunha para inibir o recrudescimento da impunidade no País, o Tribunal resolve afetar à Justiça Eleitoral a competência para julgar crimes comuns conexos com crimes eleitorais.
Viu-se, com pesar, os xingamentos aos procuradores pelo ministro Gilmar Mendes, a revelarem a carência de argumentos convincentes, posto sabido que a Justiça Eleitoral não tem efetivamente aptidão para julgar crimes como corrupção, organização criminosa e lavagem de dinheiro. O próprio Gilmar Mendes é o testemunho vivo disso com o voto no TSE que absolveu a chapa Dilma/Temer, apesar das inúmeras provas em sentido contrário apresentadas em grande estilo pelo ministro Hermann Benjamim. Como daquela vez, Gilmar se esqueceu de que o processo eleitoral merece se desenvolver protegendo princípios e valores acolhidos pela Constituição, entre os quais não se abriga o contubérnio com a impunidade.
Por conseguinte, pêsames à Corte que pretende se conservar suprema, porquanto, em países verdadeiramente democráticos, nenhuma supremacia consegue se manter sem os alicerces da legitimidade, a qual se lastreia, em última análise, na crença de que a cúpula de qualquer dos poderes constituídos se compõe de gente dotada de sabedoria e discernimento para bem separar o joio do trigo. continuar lendo